sexta-feira, 24 de agosto de 2012

bloco (textil) do eu sozinho II


  ao longo do meu dia cinzento decidi explorar minha
dúvida, tirar teias do sotão das minhas idéias, inspecionar as
engrenagens que compunham minhas crenças, n'algum lugar deveria
estar a origem de meu desconforto, não seria possível levar essa
'pedra no sapato', que já se tornara 'tijolo' a essas alturas.
como medida inicial, decidi ser o observador de meu sentir, do
momento seguinte em todas minhas ações, olharia pra meus
sentimentos na atividade qualquer que estivesse, buscaria pistas
da origem da minha tristeza que até então era intangivel a minha
consciência diária semidesperta.
  transitara o dia distante, olhava ao longe aos olhos
familiares mas de fato olhava para mim mesmo, tinha por certo
uma sensação estranha, muito pouco daquilo eu havia feito em
toda a minha vida e ao longo da mesma havia caminhado com muitos
sentidos ao lado externo de minha existência, sentia talvez que
de fato não conhecia esse porção de mim, um desconforto de estar
a sós com alguém recém apresentado, nenhuma descrição melhor.
          tomara café inicialmente e após um banho quente, me
vestira, pegaria a chave do carro e rumaria ao trabalho... por
todo o trajeto percebi um silêncio, um silêncio mudo, meu
silêncio... ri ao perceber que de fato se tratava de meu
interior, acho que gritara, esperneara e ultimamente já mordia
meu corpo físico o mais forte que conseguia, não por acaso minha
sensação era por vezes de dor em meu peito angústiado, por minha
longa existência jamais havia lhe dado atenção, lhe escutado,
sequer olha-lo, de fato nunca o tinha visto.
  consegui escutar os aráras gritando em árvores, gaivotas
gorjeando ao passar pela ponte que cruzava lago rumo ao
trabalho, o sol estava alto, poucas núvens eram vistas, uma leve
brisa de primavéra soprava, o lago parecia oceano, azul e
levemente agitado, o dia era claro, claro demais, agora eu o
percebia, dentro de meu silêncio, onde diabos EU estive que
olhara tudo isso sem nunca ver nada? maldição! o que mais não
pude perceber?
          ao chegar no trabalho, dei bom dia ao porteiro do
prédio, percebi seu sorriso e me pus a pensar... nunca tinha
visto, em alguns meses, o pobre diabo com menos que essa
recepção humilde mas resiliênte: esse mesmo sorriso, um leve
abaixar e levantar rápido de cabeça e um tranquilo 'bom dia'.
meu deus, o que mais não percebi? claro, eu iria descobrir que a
soma não era tão contida quanto o agir do porteiro.

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